Natal, festa da bondade de Deus
Frei Raniero Cantalamessa, OFM
Existem dois modos de manifestar a um outro o próprio amor. O primeiro consiste no fazer dons à pessoa amada. Acontece assim também na experiência humana: quando brota um amor entre duas criaturas, a primeira necessidade é fazer-se presentes e mimos para assegurar ao outro o próprio interesse e afeto.
Deus nos amou assim na criação. A criação é toda um dom: dom é o ser que possuímos, dom as flores, o ar, o sol, a lua, as estrelas, o cosmo no qual a mente humana se perde... Faz crescer o feno para os gados e a erva a serviço do homem, para que traga alimento da terra: o vinho que alegra o coração do homem e o pão que sustenta o seu vigor... (Sl 104,14s).
Mas há um segundo modo de manifestar a um outro o próprio amor, muito mais difícil do que o primeiro, é sofrer pela pessoa amada. E este é o amor com que Deus nos amou na sua encarnação. “Assim como não devia permanecer escondido quão intensamente Deus nos amasse, para dar-nos a experiência do seu grande amor e mostrar que nos ama com um amor sem limite, Deus inventa o próprio aniquilamento, realiza-o e faz de modo a tornar-se capaz de sofrer e de padecer coisas terríveis.
Assim, com tudo aquilo que suporta, Deus convence os homens do seu extraordinário amor por eles e os atrai novamente a si, eles que fugiam do bom Senhor crendo ser por ele odiados” (N. Cabasilas, Vita in Cristo, VI, 2; PG 150,645; trad. it. aos cuidados de Um. Neri, Turim, 1971). “Inventou o próprio aniquilamento”, se “despojou” (ekenosen), tomando a forma de servo (cf. Fl 2,7). Deus não se contentou em amar-nos com amor de beneficência, mas nos amou também com amor de sofrimento.
Para compreender o mistério do Natal é preciso ter o coração dos santos. Eles não ficavam na superficialidade do Natal, mas penetravam no íntimo do mistério. “A encarnação – escrevia uma destas almas – realiza em nós duas coisas: a primeira é que nos enche de amor; a segunda, nos dá a certeza da nossa salvação. A caridade que ninguém pode compreender! O amor além do qual não existe amor maior: o meu Deus se fez carne para me fazer Deus! O amor desentranhado: destruíste-te para construir-me.
O abismo do teu fazer-te homem arranca dos meus lábios palavras tão desentranhadas. Quando tu, Jesus, me fazes compreender que nasceste por mim, como é glorificante para mim compreender um tal fato!” (B. Angela de Foligno, Il libro, Quaracchi, 1985, p.712s). Durante as festividades do Natal, nas quais acontece a sua passagem deste mundo, esta insuperável, escrutadora dos abismos de Deus, uma vez mais voltando-se aos filhos espirituais que a circundavam, exclamou: “O Verbo se fez carne!” E depois de uma longa hora na qual permanecera absorta neste pensamento, quase voltando de muito longe, acrescentou: “Nenhuma criatura consegue. Toda inteligência dos anjos não basta!” E aos presentes que lhe perguntavam o que nenhuma criatura consegue e para que coisa a inteligência dos anjos não basta, respondeu: “Para compreender!” (ib. p.726).
Fonte: comunidade católica shalom
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