07 novembro 2017

7º Dia - NOVENA MEDITATIVA A SÃO LEÃO MAGNO



Sermões de São Leão Magno sobre a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo – parte 2


Texto extraído do livro "Sermões" de São Leão Magno da Editora Paulus.


(...) Desce, portanto, do reino celeste às íntimas regiões deste mundo Jesus Cristo, Filho de Deus, sem se afastar da glória paterna, gerado em ordem nova, em novo nascimento. Nova ordem, porque invisível no que lhe é próprio, fez-se visível no que é nosso; incompreensível quis ser apreendido; sendo antes dos tempos, começou a existir no tempo. O Senhor do universo assumiu a condição de servo, velando a imensidão de sua majestade. Dignou-se o Deus impassível tornar-se homem passível e o imortal submeter-se às leis da morte.

Vem à luz por novo nascimento, porque a virgindade inviolada, que ignorava a concupiscência, ministrou-lhe a matéria corporal.

Recebeu o Senhor de sua mãe a natureza, mas isenta de culpa. A natureza humana de nosso Senhor Jesus Cristo, nascido do seio da virgem, não difere da nossa por ter tido ele admirável natividade.

Sendo verdadeiro Deus, é também verdadeiro homem. Nesta unidade não há mentira, pois mutuamente se coadunam humildade humana e grandeza divina.

Como Deus não se altera por tal misericórdia, o homem não desaparece, absorvido pela dignidade divina. Age cada uma das naturezas em consonância com a outra, quando a ação é peculiar a uma delas. O Verbo opera o que lhe é próprio, e a carne executa o que lhe compete. Uma resplandece pelos milagres, enquanto a outra é sujeita aos opróbrios. Como não se aparta o Verbo da igualdade da glória paterna, a carne não perde a natureza do gênero humano. Um e o mesmo, convém repeti-lo, é verdadeiramente Filho de Deus e verdadeiramente filho do homem.
Deus, porque no princípio era o Verbo e o Verbo estava junto de Deus, e o Verbo era Deus (Jo 1,1). Homem, porque o Verbo fez-se carne e habitou entre nós (ib. 1,14).

Deus, porque todas as coisas foram feitas por meio dele, e sem ele, coisa alguma foi feita de quanto existe (ib. 1,3). Homem porque nascido de mulher, nascido sob a lei (Gl 4,4).

O nascimento carnal é manifestação da natureza humana; o parto da Virgem, indício do poder divino.

A humilhação do presépio denota a infância do menino (Lc 2,7); as vozes dos anjos declaram a grandeza do Altíssimo (Lc 2,13).

Assemelha-se aos homens em seus primeiros dias aquele que Herodes tenta impiamente matar (Mt 2,16). Mas, é Senhor de todos, aquele que, suplicantes, os magos alegram-se de adorar.
Quando procurou o batismo de João, seu precursor (Mt 3,13), para ser patente que o véu da carne encobria a divindade, veio do céu a voz do Pai que dizia: Este é o meu Filho amado, no qual ponho as minhas complacências (Mt 3,17).

Enquanto a astúcia do diabo tenta-o, como se fosse apenas homem, serve-o o exército dos anjos, como sendo Deus (Mt 4,1; 11).

Ter fome, ter sede, estar cansado e dormir evidentemente é humano. Mas, saciar com cinco pães cinco mil homens (Jo 6,12) e dar à samaritana a água viva (Jo 4,10), que não deixa mais ter sede quem a beber, andar sobre as ondas do mar a pé enxuto (Mt 14,25) e acalmar o furor dos vagalhões, falando imperiosamenre à tempestade (Lc 8,24) é indubitavelmente divino. Omitindo muitos fatos, digamos apenas: não é próprio de uma só e mesma natureza chorar por comiseração o amigo morto (Jo 11,35) e após a remoção da pedra do sepulcro de um defunto de quatro dias, despertá-lo redivivo, somente emitindo uma ordem (ib. 43); ou pender do lenho e transformar o dia em noite, fazendo tremer todos os elementos; ou ser transpassado pelos cravos e abrir as portas do paraíso ao ladrão por causa de sua fé (Lc 23,43).

Do mesmo modo não provém da mesma natureza dizer: “Eu e o Pai somos uma só coisa” (Jo 10,30) e afirmar: “O Pai é maior do que eu” (Jo 14,28). Embora seja nosso Jesus Cristo uma só Pessoa, Deus e homem, difere contudo a proveniência para as duas naturezas do opróbrio comum a ambas e da glória comum. Pelo que recebeu de nós, a humanidade, ele é menor do que o Pai; do Pai lhe vem a igualdade com o Pai, a divindade.

5. Por causa desta unidade de pessoa em duas natu-rezas lemos ter o Filho do homem descido do céu, quando o Filho de Deus, da Virgem da qual nasceu, assumiu um corpo. E novamente diz-se que o Filho de Deus foi crucificado e sepultado, ao sofrer tudo isso, não na própria divindade, pela qual o Unigênito é co-eterno e consubstancial ao Pai, mas na fraqueza da natureza humana.
Todos nós, confessamos, por isso, no Símbolo, que o Unigênito Filho de Deus foi crucificado e sepultado, segundo o dito do Apóstolo: “Se, de fato, tivessem conhecido, não teriam ao certo crucificado o Senhor da glória” (1Cor 2,8).

O próprio nosso Senhor e Salvador, querendo esclarecer a fé dos discípulos, por meio de suas interrogações, interpelou-os: “Quem dizem os homens que é o Filho do homem?” E como eles referissem as várias opiniões dos outros: “E vós”, perguntou-lhes, “quem dizeis que eu sou?” (Mt 16,13-15). Quem dizeis que eu sou, eu, o Filho do homem, que vedes na condição de servo e na realidade da carne? São Pedro, divinamente inspirado, numa confissão benéfica para todos os povos, disse: “Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo” (Mt 16,16). Foi digno, então, de ser chamado bem-aventurado pelo Senhor. Recebeu da pedra principal a virtude e o nome aquele que por revelação do Pai confessou identificar-se o Filho de Deus e Cristo. Aceitar um sem o outro não aproveita para a salvação. Igual perigo seria crer que o Senhor Jesus Cristo é Deus só sem ser homem, ou apenas homem e não Deus.

Qual a finalidade do prazo de quarenta dias após a ressurreição do Senhor (de seu verdadeiro corpo, porque ressuscitou aquele mesmo que fora crucificado e morto), a não ser libertar a integridade de nossa fé de qualquer obscuridade?

Conversou com seus discípulos, esteve na mesma casa e comeu com eles (At 1,4). Permitiu que o tocassem com diligência e curiosidade os que estavam ansiosos pela dúvida. Entrava com as portas fechadas onde estavam os discípulos; com seu sopro comunicava-lhes o Espírito Santo (Jo 20,22) e dando as luzes do entendimento, revelava os segredos das Sagradas Escrituras. E ainda mostrava a chaga do lado, as perfurações dos cravos e todos os sinais da paixão recente, dizendo: “Vêde as minhas mãos e os meus pés, sou eu mesmo; apalpai-me e observai que um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho” (Lc 24,39). Assim, reconheceriam os discípulos que nele as propriedades da natureza divina e humana permaneciam intatas, e saberíamos nós que Verbo e carne não se identificaram e que o único Filho de Deus é Verbo e carne.

(...) “Todo o espírito que confessa a Jesus Cristo encarnado, vem de Deus, e todo o espírito que não confessa a Jesus não vem de Deus. Tal é o fato do anticristo” (1Jo 4,2-3).

(...) Ouça o bem-aventurado apóstolo Pedro pregar que a santificação do Espírito se faz pela aspersão do sangue de Cristo, e não leia superficialmente as palavras do mesmo apóstolo: “Sabendo que não fostes resgatados dos vossos costumes fúteis, herdados dos vossos antepassados, a preço de coisas corruptíveis, como a prata e o ouro, mas pelo sangue precioso de Cristo, como de um cordeiro sem defeito e sem mancha” (1Pd 1,18).

Não resista também ao testemunho do apóstolo são João que diz: “O sangue de Jesus Cristo, seu Filho, purifica-nos de todo o pecado” (1Jo 1,7). E ainda: “Esta é a arma invicta que vence o mundo: a nossa fé” (1Jo 1,7). “E quem é que vence o mundo senão quem crê que Jesus é o Filho de Deus? Este é que veio por água e sangue: Jesus Cristo; não só na água, mas na água e no sangue; e é o Espírito que dá testemunho, porque o Espírito é a verdade. Três são os que dão testemunho: o Espírito, a água e o sangue, e os três são unânimes” (1Jo 5,4-8). Isto é, o Espírito de santificação e o sangue da redenção e a água do batismo. Os três são uma só coisa, e permanecem indivisíveis, sem nenhuma separação, desta sua conexão.

A Igreja católica vive de tal fé e nela progride: Não há em Cristo Jesus humanidade sem verdadeira divindade, nem divindade sem verdadeira humanidade.




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